Eu tenho 56 anos e não me sinto invisível. Não me sinto cansada nem desanimada com a vida. Tenho momentos de tristeza e de muita ansiedade, mas não me senti deprimida por causa da idade ou da menopausa. Tenho 56 anos e, quando me olho no espelho, me acho até bonita, apesar das rugas e de alguma flacidez. Na comparação comigo mesma 20 anos mais nova, o que eu percebo é que ganhei novos ângulos. Meu rosto, minhas pernas, minhas coxas, tudo afinou e desconfio que eu tenha diminuído de altura também. No entanto, acho que conservo uma certa harmonia geral e a mesma faísca nos olhos. 

Faço exercícios físicos regularmente, minha libido não se alterou e mantenho uma produção intelectual intensa. Minha curiosidade é idêntica àquela dos 30 anos de idade, mas a disposição para ir atrás do que me desperta curiosidade está mais seletiva. 

Vivo o dia de hoje a cada dia, não tenho saudades do que ficou ou do que eu decidi que deveria ficar para trás. Não me reconheço na “senhora que não entende direito o que os jovens estão dizendo” ou “essas roupas loucas dos dias de hoje”. Para alguns de vocês, eu talvez esteja sendo generosa comigo mesma. E é isso mesmo: eu sou uma pessoa generosa e também uso essa qualidade na hora de me auto-avaliar, sem pudor, porque sei que meu critério é sólido. 

Estou melhor do que a Ana Paula dos 30, porque as escolhas que aquela mulher fez e tudo que ela acumulou em conhecimento estão repercutindo agora, nesse momento em que o colágeno já não está aqui para me fazer juras enganosas de amor eterno.

Sei que pertenço a uma geração privilegiada de mulheres que chegaram aos 50 contribuindo ativamente com os processos sociais e recomeçando a viver de acordo com suas próprias opções pela primeira vez na história. Muitas de nós cumpriram o que nos foi exigido como função social e, agora, finalmente, podemos apostar em nossos próprios desejos cercadas de menos cobranças e preconceito. 

Além de nos sentirmos produtivas e livres, nós gostaríamos muito que essa energia se refletisse em como nos apresentamos, fisicamente, ao mundo. Não seria incrível ter a experiência dos 50, a relevância dos 40 e o visual dos 30? Pois é, mas uma das coisas que o tempo nos deu foi a certeza de que Papai Noel não existe, ou seja, melhor aceitar rapidinho que o melhor de nós não está na bunda empinada mas na forma física daquela coisa cheia de curvas que carregamos sobre os ombros: nossa cabeça. 

Preocupa-me, seriamente, ver que algumas mulheres de mais de 50 consideram-se modelos para todas as outras por causa da barriga chapada que não tinham aos 30! Será que isso é chegar bem ao envelhecimento, essa palavra proibida? Digo isso sem julgamentos. É realmente muito mais fácil ser reconhecida como mulher que está envelhecendo bem quando se chega aos 50 com o corpo de uma jovem de 25. É aí que mora o problema. 

Vivemos muitos anos atendendo expectativas de que cumpríssemos o percurso esperado de uma mulher “normal”. Casar, ter filhos, educá-los e priorizar seu conforto e bem-estar e depois, ao vê-los crescidos e também casados e também com seus filhos, poderíamos descansar fazendo sapatinhos de tricô para os netinhos. Se hoje podemos romper com essa imposição social não é justo que tenhamos que atender ao critério da aparência para permanecer no clubinho das modernas e influentes!

Comecei este artigo dizendo que não me sinto invisível. Se você associa visibilidade ao desejo sexual que somos capazes de despertar no outro, também me considero perfeitamente visível sob essa perspectiva. O que seduz é quem você é. Tudo em cada uma de nós, da maneira como nos movimentamos até -- e principalmente -- à propriedade daquilo que dizemos vem de cada elemento que compõe o conjunto. E a sensualidade, acredite em mim, não é consequência direta da juventude embora possa existir nela. 

Mas vamos deixar a sensualidade do plano físico de lado por um instante? Compreendo que isso é um valor na nossa sociedade e por isso mesmo me vejo impelida a dizer e repetir que não foram procedimentos estéticos nem herança genética que me trouxeram até aqui. Agradeço muito à medicina moderna, ao filtro solar e à conta bancária que trabalhei para ter pela tranquilidade com que posso encarar o futuro mas nada disso seria suficiente se a régua da minha vida medisse apenas minha cintura e a capacidade de atrair sexualmente pessoas à minha volta. 

Vamos todas envelhecer, esse verbo proibido, e podemos fazer isso esperneando ou aproveitando tudo que aprendemos até aqui. Estou dizendo que é fácil? Não. Eu gostaria de ter uma pele sem manchas e adoraria não sofrer tanto para ganhar alguma massa muscular. Minha coluna seriamente avariada depende dos músculos que treino forte para desenvolver e a cada dia é mais difícil. Mas, amigas, nós todas precisamos ser menos severas conosco. 

Uma mulher que chega aos 50 não deveria se comparar com a foto da novinha na propaganda de shampoo nem com as gostosas das redes sociais. Deveríamos estabelecer comparações apenas com nossas versões mais jovens e no que diz respeito às escolhas que fizemos. De acordo com nosso critério, melhoramos? Estamos mais espertas, mais conscientes, mais confiantes? As decisões que tomamos nos fizeram chegar a um lugar de que nos orgulhamos? Desenvolvemos a empatia e a capacidade de acolhimento? Compreendemos as lutas das mulheres dessa nova geração que estará no comando do mundo daqui pra frente? E, acima de tudo, sabemos que parte do nosso papel é apoiá-las em suas dores e vitórias como gostaríamos que tivessem feito conosco 30 anos atrás quando éramos nós as protagonistas?

Envelhecer é acumular sabedoria. Sociedades milenares valorizam os mais velhos por aquilo que eles têm ao invés de desprezá-los pelo que deixaram de ter. Temos um longo caminho pela frente mas, enquanto não mudamos coletivamente, decido eu aqui, individualmente. Não serei julgada pelo meu corpo, pela minha aparência, por minhas marcas. Permanecerei visível pelo que produzo. Mulheres velhas sempre serão bruxas. Não quero ter a verruga no nariz mas certamente conheço todas as poções e sou capaz de preparar todos os feitiços, inclusive aquele que me faz pronunciar a palavra velha sem medo de ser feliz. (Por Redação/Terra) - (Foto: Divulgação/Terra)

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